terça-feira, 13 de maio de 2008

Por que devemos continuar lutando pelas diretas no CEP

O PÚBLICO E O PRIVADO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA
Ivan de Oliveira
Doutor em Educação pela Universidade Federal do Ceará e Técnico em Assuntos Educacionais da Universidade Federal do Ceará

MECANISMOS DE ESCOLHA DE DIRETORES
Provimento por indicação.
Tradicionalmente, no Brasil, o procedimento de livre nomeação pela autoridade
executiva – governador ou prefeito – foi o que prevaleceu ao longo de décadas. Essas
nomeações, algumas vezes, estão ligadas a critérios de habilitação específica para o
exercício da função, especialmente por força de exigências normativas dos sistemas de
ensino. No entanto, obedecem principalmente a critérios políticos, cabendo ao deputado, vereador, prefeito ou, até mesmo ao chefe do diretório partidário, a indicação daqueles que devem ser nomeados. Muitas vezes, a escolha acaba recaindo sobre indivíduos sem nenhuma vinculação com a escola ou a comunidade. Celina Ferreira Calaça (1993, apud Paro, 1996), num estudo sobre a rede municipal de ensino de Goiana, GO, relata os procedimentos empregados na indicação do diretor pela autoridade, registrando detalhes sobre as influências exercidas pelos chefes políticos sobre a Secretaria Municipal de Educação, em especial os vereadores, dos quais foi possível encontrar mais de quatrocentos pedidos assinados no arquivo pessoal da secretária.
Desta forma, no processo de indicação, além ou a despeito dos requisitos de ordem
técnico-profissional, impera uma condição mais importante, a da habilitação política para o exercício da função, sendo o mandachuva local o responsável por determinar quem está, ou não, habilitado politicamente para ocupar a direção de uma unidade escolar.
Esse procedimento está ligado às raízes patrimonialistas da formação do Estado
brasileiro, que permitiram sustentar relações de troca de favores na ocupação do emprego público como lógica de seu funcionamento.
“O cargo público, a velha realidade do estamento, será o único foco do poder, poder que dá prestígio, enobrece e legitima a riqueza. Para conquistá-lo e para conservá-lo desencadeiam-se energias, ferozes ou manhosas, de acordo com as circunstâncias e com a oportunidade (FAORO, 1997:310).

Na indistinção entre o público e o privado está a origem de uma socialização
familiar, doméstica e afetiva que impede que se criem as condições para uma real gestão da coisa pública (Holanda, 1971). Sérgio Buarque de Holanda chega a afirmar que sem a transgressão desta “ordem familiar” não se pode, sequer falar de Estado ou de cidadão:
O Estado não é uma ampliação do círculo familiar e, ainda menos, uma integração de certos agrupamento, de certas vontades particulares, de quem a família é o melhor exemplo (...) só pela transgressão da ordem doméstica e familiar, é que nasce o Estado e que o simples indivíduo se faz cidadão, contribuinte, eleitor, elegível, recrutável e responsável ante as leis da Cidade (HOLANDA, 1971:101).

Assim, a interferência política acaba por se constituir importante elemento na
composição dos fatores que determinam a escolha de quem deve ocupar o cargo público de diretor da escolar, considerando-se, em especial, situações de compadrio e influência política do candidato. Esse procedimento caracteriza o fenômeno do clientelismo , por meio do qual políticos profissionais oferecem ajuda pública ao seu alcance como cargos, empregos e recursos públicos, chancelas estatais e todo o tipo de privilégios quem seu status lhe permite obter, em troca de apoio e fidelidade pessoal.O clientelismo como acesso ao emprego ou cargo público e sua relação com o
contexto de democratização do país foi analisado por Martine Droulers, que chama a
atenção para o fato desse fenômeno estar incrustado nas instituições, infiltrado nas malhas da burocracia estatal com bastante eficácia, caracterizando-se como uma relação de troca.
Até uma sociedade como a brasileira que sempre distribuiu empregos públicos para que uma elite pudesse assentar o seu poder político, a relação de clientelismo exprime mais do que uma simples relação de dependência e de domínio, ela é antes de tudo uma relação de troca que regula as relações sociais. O patrão fornece um emprego, e o cliente lhe trará a sua ajuda no momento das eleições ficando ainda à sua disposição. Não se trata, pois, de uma relação de exploração, nem mesmo de troca desigual, porque tanto o patrão quanto o cliente encontram, nessa relação, alguma vantagem e, assim, ela acaba sendo considerada legítima (DROULERS, 1989:127).

Caracterizada a relação de troca de favores que o clientelismo abarca, é fácil
entender a sanha com que os políticos caem sobre a escola pública como braço estendido do Estado nas comunidades onde desejam implantar ou consolidar suas influências. Ter um diretor escolar como aliado e dependente político é ter a possibilidade de deter o controle de uma instituição que atende diretamente parte significativa da população por meio de um contato direto e sistemático.
O diretor pode convocar a população a estar presente na escola pelos mais diferentes motivos, pode atender, solicitar, cobrar, pressionar, algumas vezes impor. Por isso, não é difícil supor que, tendo em vista a importância da manutenção de relações clientelistas para os políticos descomprometidos com os interesses da maioria da população, tudo façam para mantê-las, impedindo que regras democráticas para escolha do diretor escolar sejam instituídas.
Para melhor compreendermos essa situação vamos citar um exemplo de Vitor Paro
apoiando-se em estudos realizados por pesquisadores que investigaram o clientelismo nos sistemas de ensino de Goiás e no município de Volta Redonda/RJ. No primeiro caso, é descrita a pressão exercida por prefeitos do estado para impedir a aprovação de lei regulamentadora das eleições de diretores pela Assembléia Legislativa do Estado de Goiás, bem como a mudança de posição de políticos que defendiam eleições durante a campanha e exigiram indicar diretores quando chegaram ao poder. No caso do município de Vitória/RJ, o autor se reporta ao fato inusitado de que, com receio da perda dos privilégios dos vereadores na indicação dos diretores, a câmara Municipal, além de rejeitar um projeto de lei que instituía eleições, aprovou outro em seu lugar, proibindo qualquer tipo de eleição para a escolha dos diretores e das funções técnico-pedagógicas em escolas municipais.
O provimento do cargo de diretor escolar por meio de indicação exige pouca ou
nenhuma regulamentação. A legislação relativa à indicação de diretores, de modo geral, é promulgada tendo em vista a superação daquele mecanismo. Por isso os critérios que norteiam a escolha dos indicados são, quase sempre nebulosos, prevalecendo a pressão ou a força de lideranças políticas, para as quais importa, apenas, a correspondente fidelidade dos que são contemplados com a indicação.
¹ A expressão clientelismo, de uso corrente na Sociologia e na Ciência Política está ligada ao fenômeno da clientela romana que deu origem ao termo e é seu exemplo mais conhecido. O termo definia a relação de dependência econômica e política entre um indivíduo de posição mais elevada e seus clientes, ou protegidos. Enquanto o patrono tinha o compromisso de defender seus protegidos em juízo, destinar-lhes terra, os clientes retribuíam com submissão, deferência, auxílio, testemunho a seu favor.

Um comentário:

orquidea disse...

Porque aquela mulher que está diretora, não merece o cargo!
Ela deve pagar pelas injustiças que cometeu, com todas as pessoas que trabalharam e ainda trabalham por lá.
Aos que deram as costas a seus colegas de trabalho por dinheiro, também devem pagar.
E por isso eu acho que as eleições devem acontecer, porque só assim as pessoas vão pensar duas vezes antes de pisar nos outros, antes de utilizarem de seus cargos de chefia para intimidar seus colegas de trabalho ou utilizar-se do velho modo de dizer que não quer se meter, para dar as costas aos seus colegas de trabalho de anos, por um cargo ou uma vida tranquila aos olhos do Rei.