quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Carta de professora para Madselva

Prezada Professora Madselva,

Há algum tempo atrás lhe entreguei uma carta com uma avaliação e sugestões em relação a sua gestão. Não recebi nenhuma resposta formal. Naquele momento ainda acreditava que era possível viabilizar o seu projeto de escola, projeto este que só tomei conhecimento através de nossos coordenadores na área de História, porque infelizmente, ao longo deste ano, não houve discussões pedagógicas. Penso que as condições necessárias para viabilizar o projeto não foram construídas e que hoje ele só poderia se efetivar com atitudes autoritárias, o que seria contraditório e incoerente com uma visão democrática, que é a essência de qualquer projeto. Quando lhe perguntei como vai construir a sua proposta, a senhora disse que a partir das “relações sociais”. Eu pergunto: que relações? Desde o início deste ano sua presença tem sido marcada por tensões. Lembro-me muito bem quando no mês de maio a senhora pediu no Conselho que também queria ser aplaudida. Mas não foi. Por quê? O momento que a vi sendo aplaudida efusivamente pelos alunos, foi na sala 113, no dia 7, quando a senhora pediu desculpas a um aluno depois de um momento tenso. Mas ali já estava difícil recuperar o elo perdido. Enquanto a senhora tentava conversar com mais ou menos 100 alunos, centenas de outros já estavam organizados com uma só palavra de ordem. Vejo que não há mais clima agora e o bom senso mostra que às vezes é necessário recuar para vencer, não medir forças. Contudo, tenha em mente que boas idéias não morrem, mas há de ter o momento certo para implementá-las.
Na sexta feira, dia 9, saí da sua sala junto com a comissão tendo a angústia de vir a olhar nos olhos dos alunos e professores os quais esperavam por uma resposta e que clamavam por um único pedido: “Vamos retornar a paz neste colégio, queremos dar aulas novamente com equilíbrio”. Naquele momento me senti incapaz. Mas ao sair na escadaria encontrei alguns alunos do ano passado que cursam hoje história e pedagogia na UFPR. Lembrei-me mais uma vez que o CEP não é apenas um nome, mas é uma unidade, uma identidade, professores e alunos do CEP tem uma relação de amor com esta escola que permanece após a formatura e as aposentadorias.
Hoje, após os acontecimentos da última semana, quero dizer que vivemos momentos de tensão, de insegurança, de dor, de ver colegas chorando de angústia, mas que também foram momentos de beleza e consciência de cidadania quando nossos alunos fizeram o “retorno à prática social”, como diz Saviani, que eu aprendi através de suas falas em meados da década de 80.
Isto mostra que existe um outro lado que o momento propiciou. Apesar de todo este clima, vi nos alunos do CEP o brilho nos olhos que eu tinha em 1984 quando entrando na Universidade fui para a rua participar das “Diretas Já”, vi a mesma confiança, a esperança e a indignação que moveu os “caras pintadas” em 1992, que eu também estava lá e foi a partir de uma fala sua na APP, que naquela época saí junto com os alunos para a rua. Vi um movimento explodir no CEP, sem o nosso controle, vi alunos que nas minhas aulas raramente se pronunciam pegar em microfone e lhe questionar duramente. Vi o orgulho de abraçar o CEP e dizer para Curitiba “CEP eu te amo”, vi o cuidado com as flores do jardim intactas, vi a emoção e as lágrimas ao cantarem juntos “Pra não dizer que não falei das flores”. A consciência e a cidadania foram despertadas espontaneamente.
Temos que ficar atentos, pois a História nos mostra como começa uma revolta, mas nunca poderemos saber como ela vai terminar. Acredito que as relações são construídas a cada dia e são alimentadas pela positividade e pelo respeito. Aí lhe pergunto: Se a senhora continuar na direção, como vai participar da formatura no dia 18 de Dezembro? Como os alunos irão recebê-la com aplausos ou vaias? Ou a diretora geral do CEP pela primeira vez na história não vai participar deste momento tão importante? Ou mais além, se esta situação se prolongar como vai falar novamente na Universidade, aos professores da rede estadual ou municipal, sobre uma escola democrática se a sua gestão desencadeou uma revolta estudantil sem igual na história do CEP, hoje documentada nos jornais, na internet, e principalmente na memória de todos os que viveram a semana passada. E penso que processos não apagam esta memória
Eu ainda lembro das falas suas que ouvi no Colégio Unidade Polo, no Colégio Guimarães, na APP, na UFPR, na Fazenda Rio Grande, que muito inspiraram a minha prática profissional. Muitas destas falas, hoje, eu repasso às minhas alunas no Curso de Pedagogia. Não esqueço o que cantávamos em 1984: “Nova aurora a cada dia e há de se cuidar do broto, pra que a vida nos dê flor e fruto” (Coração de Estudante).
Hoje mais do que nunca acredito que tudo que aprendemos é pelo amor ou é pela dor. Encerro com as palavras de Lao Tse ao descrever o sábio há mais ou menos 600 a.C.
“Aquele que conhece os outros é sábio, aquele que conhece a si mesmo é iluminado
Aquele que vence os outros é forte, aquele que vence a si mesmo é poderoso.
Seja humilde e permanecerás integro, curva-te e permanecerás ereto.
O sábio não se exibe e por isso brilha, ele não se faz notar e por isso é notado
Ele não se elogia e por isso tem mérito.
E por não estar competindo, ninguém no mundo pode competir com ele“.



Atenciosamente,

Professora Cleusa (História) 12/11/2007.

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